quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Lucidez silenciosa


Existe um copo deslocado sobre a mesa, usado e sóbrio de vazio,
Assim como jazem à sua volta as cadeiras inertes à espera de nada,
A luz do mesmo dia, fugaz, cobarde e trémula, afasta-se na timidez,
Abrindo as trevas antes de algo findar, ou a noite que sinto esgotada,
Escarnece desta minha solidão e da minha eterna silenciosa lucidez.

Sinto o meu respirar tão frágil. É assim que calculo o teu regresso,
Sinto o meu querer acompanhar-te à saída, mas só o olhar acontece,
Enquanto adormeço o receio e brindo à demora de uma vil melodia,
Breve num sonho que me deixa, parco na escolha do que me oferece,
A outra vida, talvez aquela que a minha coragem nunca escolheria.

São momentos quietos, fingidos. Como este lugar que me atormenta,
Como deixo o cansaço neste corpo entrar, já sem esperar por nada,
Chega ferido e inesperado o sorriso da minha esperança moribunda,
Assim como tem lágrimas esta vida que trago pela mão mascarada,
Carregando a alma neste corpo alugado, sendo apenas dor profunda.

O tempo que nunca foi meu, esqueceu-me e eu deixei-me, esquecido,
Minhas preces foram tormentos e sobras raras de gritos silenciosos,
As minhas amantes foram mulheres a que o destino findou o amor,
Aos meus amigos libertaram a inveja e os infelizes lobos raivosos,
Queimando queridos seres e feitiços, criando medos e jogos de pavor.

Grades que apenas existem na minha vontade, já nada encerram,
Imagino esta cela, as pedras deste chão húmido e frio de degredo,
Onde deixo existir sons que sei de cor, e os murmúrios de piedade,
Fito pela última vez os carrascos que escondem o meu segredo,
Homem acabado, renascido na silenciosa lucidez da minha vontade.

JMC In Redenção


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