O copo vazio que me sobra na mão, enche-me o arrependimento,
Luzes de néon, frustradas nos bares iluminam a demente solidão,
Uma sirene sôfrega de intermitência interrompe-me os sentidos,
Tenho um momento, disparo meus passos sem qualquer direcção,
Subo ao carrossel da incerteza, desço alheio no desconhecimento,
Grito, empurro a raiva, tapando a boca com os meus dedos feridos.
As minhas parcas memórias aceitam-me enquanto eu não me perco,
Sinto a pele a ficar fria, a prostituta aproxima-se sem minha vontade,
Dá-me um valor e sem querer faz-me sentir a minha dor esquecida,
Acabo no meu preço, o beijo que evitamos é justamente essa verdade,
Dou-lhe o braço, as carícias são demasiado caras, saio só deste cerco,
Acompanha-nos uma sombra que julgo ser a minha vida despida.
Tenho uma vida vazia, onde não te deixo entrar,
O cerco acaba com o dia, eu acabo sem terminar,
A minha noite arrefece enquanto o céu se apaga...
Dispo o corpo que me oferece uma sedução vaga...
O tráfego desconhece os sinais e os sentidos contrários determinam,
Que os saltos altos pelo passeio ensurdeçam a minha negra lucidez,
O elevador encerra-me na rotina, enquanto os rituais se despem,
Os lençóis encobrem a sua inocência, eu descubro a minha vez,
Enrolamos um cigarro, acendemos as palavras que nos ensinam,
Discutimos por um punhado de ideais que sempre nos esquecem.
Volto à rua, o que a garrafa me oferece é algo em que eu acredito,
Nesta roleta os dados não são meus, os parceiros de jogo morrem,
Outros sem abrigo acenam-me, e vejo-me a perder sem ter jogado,
Aceito um nome falso, um número invisível, mas não me acordem,
Sei que este sonho não é meu, estou vestindo apenas um fato bonito,
As feridas que não cicatrizam mostram-me que ainda estou cercado.
Piso a seringa que inscreveu mais um nome nos jornais da manhã,
Olhos brilhantes, no beco da discórdia, eu sinto que algo vai mudar,
Os ritmos urbanos entram pelos escuros becos de uma irmandade,
Desconheço os bens mascarados, o ódio é algo mais que quis roubar,
Agora levanto os corpos, o sol quer nascer, a lua deita-se minha irmã,
O que resta de mim vai deixar o cerco vazio, ganhando a liberdade.
JMC In Redenção